Sérgio Dal Sasso: consultor palestrante administração, empreendedorismo e carreiras

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Organização de empresas de A à Z - Gestão e treinamentos

sábado, 27 de outubro de 2012

“É preciso desafiar o status quo”

por Julio Caldeira
 
Fonte: Canal RH
Autor: Julio Caldeira
 
No Brasil, de maneira geral, a área de Recursos Humanos das empresas ainda é muito cúmplice do poder. Falta coragem para intermediar conversas sem tomar partido. A opinião é do consultor belga-suíço Didier Marlier, sócio fundador da consultoria Enablers Network. Ele ministrou palestra em São Paulo há poucas semanas, a convite da Academia do Conhecimento, ligada à consultoria Torres Associados. A uma plateia formada por profissionais de Recursos Humanos, ele buscou responder perguntas que não querem calar no universo do setor: como agir de forma estratégica dentro da empresa? Como inovar em suas práticas? Como contribuir para o engajamento dos colaboradores? Na ocasião, Marlier concedeu entrevista exclusiva ao CanalRh, na qual falou sobre os desafios na gestão de pessoas e de negócios na era do que ele chama de economia de fonte aberta – baseada mais na colaboração do que na competitividade entre seus agentes. Confira a entrevista:
 
CanalRh - Como é possível levar novos conceitos, mudanças de mentalidade e inovações para o dia a dia das empresas?

Didier Marlier - O erro tem sido começar a mudança exclusivamente pela agenda intelectual, tentando convencer intelectualmente as pessoas. O mais famoso neurocientista no momento, o português António Damásio, comprovou que se você não consegue conectar o lado racional com suas emoções tende a ficar na intenção e não parte para a ação. E o que você me pergunta é isso: como passar das boas intenções para a ação? Há várias coisas que podem fazer acontecer. A primeira é a geração Y, que não quer mais jogar com as mesmas regras de antes. Ela mesma já está criando as rupturas comportamentais e de cultura dentro das empresas – e tirar esses jovens do jogo não é opção porque eles são maioria (risos). A segunda coisa são os próprios líderes, que estão começando a perceber que é preciso mudar. Eu trabalho principalmente com boards e vejo que eles começam a concordar com essas mudanças – ou seja, o acordo intelectual já está lá. O que falta agora é engajar. E para isso é preciso ‘co-criar’, criar junto com os funcionários, deixando claro porque tal coisa está sendo implantada, dar sentido para as mudanças e fazê-los se apropriar delas. E no nível comportamental, o líder tem que demonstrar que alguma coisa mudou.
CanalRh - Então, simplificando, todos os esforços de mudança têm esquecido que estamos falando de seres humanos e não de processos?
Marlier - Exato. E com isso esquecemos que, se o líder não mudar seu comportamento, nada mais vai mudar. Se a liderança não tocar as emoções de suas equipes, as pessoas vão olhar para ela e dizer: “Ah, ok. Boa ideia. Mas você começa?” Ou seja, ninguém vai se engajar. E o papel do RH nisso tudo tem que ser o de provocar, questionar, tanto os líderes quanto as equipes.
CanalRh - Cobra-se muito que o RH saiba o seu papel dentro da empresa. Mas, uma vez encontrado esse papel, como fazer para não se prender nele, para que as ações não fiquem engessadas?
Marlier - A capacidade de se ‘requestionar’ é cada vez mais fundamental no mundo de hoje. É grande o risco de que o RH recrie o seu papel e fique bloqueado nele novamente. Mas lidar com a economia de fonte aberta é poder, de modo permanente, receber feedback e se questionar. Todo organismo autogerado tem um feedback permanente. Eu sou o presidente, o fundador, da minha empresa. Sou o mais velho, tenho 53 anos. Mas minha diretora mais nova, que tem 25, não para de me provocar e me desafiar. É o papel dela. O dia que ela parar de me questionar é hora de ela ir embora. Então ela adora, é uma rebelde profissional (risos). Pessoas assim são fundamentais, são aquelas que impedem que os outros fiquem em suas zonas de conforto. Eu tenho dois encontros por ano com meus sócios e nessas ocasiões nunca falamos de estratégia, tratamos de emoções e comportamentos.
CanalRh - Nas empresas, a necessidade de gerar lucro, muitas vezes, pode inibir a criatividade, a mudança, a inovação. É preciso repensar as maneiras de se ganhar dinheiro?
Marlier - Acho que o Brasil tem uma vantagem nisso. Vocês têm uma capacidade de se reinventar, questionar, recriar, que é fantástica. Onde acho que o Brasil ainda deixa a desejar é que, aqui, herói é quem tem dinheiro, tanto que um dos heróis brasileiros é o Eike Batista! E as telenovelas brasileiras fomentam isso, vinculando, reproduzindo esse conceito de classe A, B, C para uma nação inteira. Isso me deixa horrorizado. É quase como as castas na Índia.
CanalRh - Mas assim é o capitalismo, não?
Marlier - O capitalismo financeiro é assim. Se eu trabalho como um camelo é justo que eu ganhe mais do que meus colegas que vão esquiar e jogar futebol no final de semana. Mas essa é uma escolha minha. Não sou forçado a isso, muito menos para me sentir uma pessoa melhor que as outras. Na Suíça você não faz show com seu dinheiro, você não ostenta. É um país profundamente igualitário e totalmente capitalista. Então ou o capitalismo se reinventa ou ele vai morrer. Minha aposta é que ele vai se reinventar.
CanalRh - Como você acha que o RH pode construir uma imagem de promotor de diálogos – para além de ser aquele departamento que organiza treinamentos ou palestras?
Marlier - Eu acho que o RH no Brasil ainda é muito cúmplice do poder. E o diretor de RH tem que ter a coragem de intermediar as conversas sem tomar partido. Alguém foi reclamar do chefe no RH? Pois bem, então vamos lá conversar com ele agora. Todos juntos. É difícil, mas se o RH quer se livrar da imagem de um departamento que, no fundo, não pode fazer nada, é preciso comprar essa briga. E não se preocupar em vir com soluções, mas focar em fazer perguntas, desafiar o status quo.

CanalRh - Você conhece casos assim?
Marlier - O RH da Rhodia, na França. O diretor de RH deles, Philippe Bobin, tem muita credibilidade, inclusive entre quem cuida do business. Todos sabem que ele não está lá para brincadeira. Ele é muito estratégico.

CanalRh - O brasileiro tem fama de passional e, de fato, muito se ouve de problemas entre líderes e subordinados, entre colegas, birras, picuinhas. Enfim, coisas que nada têm a ver com o negócio, mas com comportamento mesmo. Como o RH pode lidar com os humores?
Marlier - Acho que o RH precisa trabalhar mais sua imagem de adulto maduro. E o que eu vejo [no Brasil] é muito RH caindo no papel de pai protetor da criança que se machucou – ou seja, do funcionário que fez bobagem ou foi injustiçado pelo chefe. Desculpe-me, mas não me interessa falar com crianças, quero conversar com adultos, de forma madura. Eu não sou seu pai e não vou resolver seus problemas, quem vai resolvê-los é você. Eu posso ajudar, criar o ambiente. E aí voltamos no que eu disse antes. Então vamos todos falar com o seu chefe. Sem medo nem superioridade.

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