Sérgio Dal Sasso: consultor palestrante administração, empreendedorismo e carreiras

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Organização de empresas de A à Z - Gestão e treinamentos

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Sonegação: piorou para melhor

Autor: Ivan Corrêa
Fonte: GS&MD

Observa-se um movimento irreversível, forjado em diferentes esferas governamentais, que tem tornado mais difícil a vida de muitas empresas varejistas: o aperto cada vez maior contra a sonegação de impostos. A substituição tributária e a tecnologia para detecção de sonegação vêm mudando a maneira como as empresas varejistas conduzem seus negócios. Para as empresas que sonegam impostos, o cenário piorou, e muito. Para as empresas que atuam corretamente, e para a sociedade em geral, o cenário melhorou, mais ainda. No balanço, piorou para melhor.

Existe um contingente considerável de empresas varejistas que compõem um universo paralelo e ocultam suas práticas desonestas sob eufemismos como “planejamento tributário”. É a chamada “economia subterrânea”, definida pelo Instituto ETCO como sendo a produção de bens e serviços não reportada ao governo, deliberadamente, para evadir impostos e contribuições para a seguridade social; e evitar o cumprimento de leis e regulamentações trabalhistas e os custos decorrentes do cumprimento de normas aplicáveis na atividade.

Diversos estudos indicam que o varejo brasileiro pratica até 40% de sonegação nas suas vendas, dependendo do setor. É quase como se dobrássemos os números oficiais publicados por órgãos como o IBGE. A distorção é que esse índice de sonegação não é praticado de forma equânime pelas empresas varejistas. Geralmente, quanto maior a empresa menor o grau de sonegação, até porque fica ampliada sua visibilidade perante governos, agentes e sociedade. O grande desafio é identificar os fatores que deixam rastros de sonegação, sem necessariamente perguntar diretamente.

Sonegação é como mortadela: muitos adotam, mas poucos admitem. Trabalhos desenvolvidos pelo Instituto ETCO em parceria com a FGV sugerem que, quanto maior o nível de atividade econômica, corrupção e carga tributária, maior a sonegação. De maneira inversa, quanto maior o volume de importações, menor a sonegação.

Pode parecer que a sonegação é um fenômeno de base econômica, mas não é. Para o Banco Mundial, por exemplo, trata-se de um fenômeno social, cuja base é que a sociedade tolera, e eventualmente aprova, que as empresas deixem de repassar recursos aos governos. É como um pseudo-Robin Hood, que tira dos ricos, mas depois se esquece displicentemente de dar aos pobres, embolsando sozinho esses ganhos. Nessa linha, já ouvimos justificativas como “a população se beneficia, pois podemos vender mais barato”. Balela. Quem se beneficia mesmo é a empresa que sonega e seus acionistas, pelo menos no curto prazo. A população deixa de receber recursos para infraestrutura, como saneamento, saúde, educação, segurança e transporte. A empresa saía ilesa dessa história, ou pelo menos assim parecia.

Nessa atuação, Robin Hood vai desenvolvendo em seu interior uma espécie de câncer, e as empresas sonegadores acabam se expondo perante funcionários e fornecedores, criando vários “sócios” involuntários. Tecnicamente, câncer é o crescimento desordenado de células, que acaba causando os tumores. Essa metáfora é exemplar, pois vários tumores podem ser identificados em uma rápida visita. Afinal, controlar as práticas de sonegação não é para qualquer um. São compradores obrigados a pedir ao fornecedor que emita meia-nota. É o DP que tem folha de pagamento paralela para controlar o pagamento das comissões pagas por fora do salário registrado em carteira. São gerentes de loja que administram a emissão dos cupons nos PDVs. E por aí vai.

Assim, desenvolvem-se mecanismos para planejar e controlar a sonegação, mecanismos esses que vão ficando cada vez mais sofisticados e, não raro, mais caros, conforme a empresa cresce. Multiplica-se uma plêiade de documentos oficiosos, que vão tornando a burocracia interna cada vez mais pesada. Perdem eficiência interna e eficácia externa, pois os melhores talentos do mercado não costumam ficar por muito tempo em empresas assim. Se a empresa não dá claros indícios de que essa situação é transitória, transitória é a permanência de verdadeiros talentos. Estudos mostram que as empresas integrantes da economia subterrânea são menos produtivas, e, portanto, menos competitivas. Acreditam que compensam suas ineficiências com escabrosos “ganhos não operacionais” da sonegação. Mas não conseguem, e o dinheiro que entra a mais de maneira indevida acaba sendo parcialmente absorvido pela ineficiência interna e pelo enorme passivo tributário e trabalhista que vai se acumulando.

Desnecessário dizer que a anacrônica estrutura tributária brasileira, com uma miríade de impostos, contribuições, taxas, tributos, normas, regulamentações etc. acaba dando brechas para sonegações gigantescas. Para piorar, a fiscalização ineficiente e frequentes anistias acabavam premiando quem sonegava, em detrimento de quem agia corretamente. Mas é exatamente aí que o jogo está virando. Se a tão esperada reforma tributária não ocorre, observa-se que pelo menos a fiscalização tem sido mais eficiente, com mecanismos tecnológicos que escanteiam do processo o fiscal corrupto e obrigam a empresa varejista a recolher seus impostos e multas quando autuadas. Piorou para melhor.

Assim, começamos a ter um ambiente com competição mais justa, em que a diferença de desempenho de uma empresa varejista será proveniente da qualidade da sua gestão. O Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV) tem como um de seus princípios que o desenvolvimento do varejo passa, necessariamente, por uma conduta ética e legal que contribua para o desenvolvimento do Brasil. O importante não é somente obter grandes resultados para os acionistas por meio de técnicas tributárias pouco ortodoxas, mas sim atender de maneira satisfatória todos os demais interessados, os chamados stakeholders. Assim, a fonte de lucro da empresa deve ser mercantil, sendo a venda de produtos e serviços a base constitutiva do seu desempenho econômico.

Normalmente, as grandes redes estão anos-luz à frente das pequenas e médias, não apenas porque cumprem as regras do jogo, mas porque já possuem mindset orientado ao mercado, e não a ludibriar os stakeholders. Possuem, ou estão mais próximas de possuir, competências em pessoas, processos e sistemas capazes de obter o lucro mercantil que seria natural em uma operação de varejo. Cabe agora ao pequeno e médio varejo reinventar sua gestão, profissionalizando-se o quanto antes, sob pena de ser vitima de uma falsa fórmula da riqueza. Realmente, piorou para melhor!

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